O mundo das viagens é repleto de clichês e eu quase fui levado por um a Innsbruck, minha terceira parada na Áustria. A questão em si é que a cidade é sempre lembrada apenas por sua famosa região de esqui, mas a realidade é bem diferente. Eu fui perceber a verdade somente quando desci do trem e caminhei 15 minutos por suas ruas e avenidas. No horizonte, o pôr do sol tingia de rosa a cadeia de montanhas nevadas onde dois Jogos Olímpicos de Inverno foram disputados, em 1964 e 1976.
Mal tinha chegado e já estava de queixo caído com o Triumphpforte, nome do Arco do Triunfo erguido há mais de 250 anos. Surpreso fiquei também com o longo calçadão Maria-Theresien Strasse, ladeado por casas dos séculos 17 e 18 e inúmeras lojas, cafés e galerias de arte. Aliás, é aqui que fica também a Rathaus, o prédio da prefeitura, adornado com um monumento que virou cartão-postal: a Coluna de Santa Ana (Annasäule), erguida em 1706. Além disso, bem ao lado, tem o Altes Landhaus, um palácio barroco construído em 1728.
Origens
Já deu para perceber que não é “só uma estação de esqui”… Portanto, logo eu estaria familiarizado com a rica história dessa cidade de 130 mil habitantes. Ela foi disputada por povos e civilizações ao longo de quase dois milênios. Isso porque lá para o ano 100 d.C., os romanos descobriram um atalho natural que permitia cruzar os Alpes sem precisar escalar as majestosas montanhas da região. Ele se chama Passo de Brenner, uma valiosíssima ligação terrestre entre a Europa Central e as terras italianas.
Essa descoberta estratégica gerou glórias e tragédias. No comecinho do século 16, o Sacro Império Romano Germânico botou as mangas de fora e mudou sua capital para Innsbruck. A chegada da corte dos Habsburgos enriqueceu sobremaneira toda essa região. Por outro lado, em todas as guerras desde então, a Capital dos Alpes sofreu bombardeios, cercos e outros percalços. Assim, boa parte dela foi pelos ares na Segunda Guerra Mundial, quando os aviões ingleses e americanos tentaram destruir a ferrovia que a Alemanha Nazista usava para levar armas ao front italiano (onde o Brasil tinha suas tropas, vale lembrar).
Tirol
Mas devagar com a aula de história… Afinal, Innsbruck é também a capital do estado do Tirol – famoso por seu folclore e pelo jeito bonachão e alegre do povo. Foi exatamente essa faceta que decidi conferir em minha primeira noite por lá, então corri para o Tiroler Abend – jantar com música e danças típicas.
Por € 55, pude devorar um generoso wiener schnitzel com cerveja, apfelstrudel de sobremesa e, é claro, o show em si rolando no palco. Durante uma hora e 15 minutos, cerca de 20 artistas exibem danças animadas, com música ao vivo, quase sempre inspiradas na vida rural do Tirol.
Muito divertido, por exemplo, ver machados, serrotes e sapatos fazerem as vezes de instrumentos musicais – algo de uma criatividade admirável. Homens de bermudas e chapéu, mulheres de vestidões e lenços coloridos, tudo conspirando para um clima de alegria quase carnavalesca, que não costumamos vislumbrar em se tratando de povos germânicos.
E um detalhe: tal qual uma trupe circense, a equipe do Tiroler Abend é em boa parte toda pertencente a uma mesma família, o clã Gundolf, que idealizou o show em 1967. Como costumam viajar mundo afora para apresentar o show, vale a pena conferir a agenda no site deles antes de ir.
Terminado o show, retornei para a necessária noite de sono no Stage 12 by Penz, um hotel de design bem no reduto mais jovem e futurista da Maria-Theresien Strasse. Jovem e futurista? Sim, Innsbruck também é um dos maiores redutos universitários da Áustria (mais de 30 mil estudantes), sede de startups e empresas de tecnologia. Por isso, há uma vertente contemporânea no cenário e o Stage 12 exemplifica isso com sua arquitetura arrojada, bar trendy, baladas vizinhas e diárias muito em conta, a partir de € 110 por noite.
Abraçado pela história
Refeito da noitada tirolesa, iniciei o dia peregrinando pelos marcos turísticos mais célebres da municipalidade alpina. Assim como Viena e Salzburgo, Innsbruck tem seu cartão de descontos e vantagens. É o Innsbruck Card, que dá acesso gratuito a todo o transporte coletivo, ao ônibus turístico hop-on-hop-off, ao teleférico que leva ao alto das montanhas Nordkettee, e claro, a 24 museus, palácios e atrações diversas. O passe de um dia custa € 49, enquanto o válido por dois dias sai por € 55 e o de três dias vale a bagatela de € 66.
Comecei pela Stadtturm ou City Tower, como é chamada a torre inaugurada em 1450 com a função de servir de posto de observação da guarda da cidade. Por quase 450 anos os vigilantes alertaram os cidadãos sobre invasões, incêndios e outros perigos. Depois, ela virou atração turística.
Com sua arquitetura gótica, seu belo relógio e um domo que atinge 51 m de altura, ela pode ser visitada por € 4,50. Seus 133 degraus levam à plataforma de observação 31 m acima do nível da rua, o que é suficiente para uma visão panorâmica das ruas medievais, assim como da rampa de esqui Bergisel, da montanha Patscherkofel e da Cordilheira Nordkette à distância.
Teto de ouro
A torre só é superada em termos de fama pelo Goldenes Dachl (“teto de ouro”, em português), o telhado decorado com 2.657 telhas douradas pelo imperador Maximiliano I no ano 1500, para celebrar seu segundo casamento, com a duquesa Bianca Maria Sforza.
Hoje é a maior atração da cidade velha, não só por sua beleza, mas pelas lendas que amealhou ao longo dos séculos. Logo após a inauguração, choveram reclamações sobre o telhado. Isso porque dizia-se que era um insulto à falecida primeira esposa de Maximiliano I, a duquesa Maria de Borgonha. Por isso, ele mandou acrescentar um desenho dela nos afrescos que acompanham o balcão, sobas telhas. Hoje em dia, turistas curiosos ficam tentando achar a gravura no meio desse quebra-cabeças.
Se por fora o “telhado de ouro” encanta pela suntuosidade, por dentro, ele é pleno de história. Sua base foi construída na Idade Média como uma prisão. Depois, virou escritório governamental e, por fim, um pequeno, mas caprichado museu, que pode ser visitado por € 5,10.
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Hofburg outra vez
Mais história ainda eu fui encontrar a dois minutos dali, no Palácio Imperial, conhecido como Hofburg (exatamente como o de Viena). É um prédio imponente, que ninguém sabe exatamente quando surgiu… Sim, porque há indícios de que no ano 1300 ele já existia, mas diminuto e com aparência bem diferente. Com a fachada atual, ele começou a se destacar no século 16, graças ao imperador Maximiliano I (sempre ele!). Depois, foi remodelado em estilo barroco no século 18, sob instruções da imperatriz Maria Teresa (aquela do calçadão, lembra?).
Há visita guiada, disponível em inglês, a € 9,50, que perpassa os luxuosos apartamentos, com seus tetos pintados de forma magnífica. Fiquei particularmente impressionado com o Riesensaal, um grande salão forrado de mármore polido, decorado com grandes afrescos no teto, que me lembraram a Capela Sistina, do Vaticano (na verdade, é esteticamente bem diferente, mas a emoção ao apreciar lá de baixo foi a mesma!).
O ponto alto para mim, no entanto, foi desvendar a soturna beleza da Igreja da Corte, a Hofkirche. Inaugurada em 1563, no estilo gótico tardio, ela é – para ser sincero – muito estranha! Mas ao mesmo tempo instigante. A excentricidade está nas 28 estátuas de figuras históricas em tamanho real espalhadas pelo ambiente, cercando a tumba do imperador Maximiliano I, que fica – acredite – bem no meio da igreja.
O enorme sarcófago de mármore preto é considerado um exemplar notável da escultura renascentista germânica. E as tais 28 estátuas de bronze que o cercam são um caso raro de mescla de estilos bem diferentes: o gótico e o renascentista.
Culinária tirolesa
Para variar, museus e palácios mexem tanto com minha cabeça que acabo esquecendo de me alimentar. Contudo, a passos dali, a Tiroler Speckeria é uma lojinha de salames, queijos e frios em geral que desde 1909 ocupa um lugarzinho na Rua Hofgasse, número 2.
O aroma e o frescor dos embutidos e laticínios cortados na hora são algo que se eterniza na memória. Além disso, tudo é produzido na região. Eles também criam seus próprios sanduíches, para você levar embora, já que as três parcas mesinhas da entrada da loja estão sempre ocupadas.
E foi isso que eu fiz, traçando com voracidade um generoso naco de bacon defumado, com fatias de queijo do tipo Bergkäse, envoltos em uma baguete rústica. Isso enquanto vagava pelo labirinto urbano.
Na verdade, antes mesmo de dar a segunda mordida no sanduíche, parei para ver outra loja de produtos típicos – desta vez, de bebidas. No número 5 da mesma Rua Hofgasse, fica a Tirol Geniessen, que vende schnapps de vários tipos. Schnapps é a aguardente local, que pode ser feita com diversas frutas.
Nessa loja, o colorido das garrafas e o perfume das bebidas também deixam traços indeléveis na memória do viajante. No meu caso, a paradinha ainda rendeu um bom papo – em português – com a atendente Chayenne, austríaca, filha de uma brasileira de Florianópolis. Faço questão de citar o fato para ressaltar uma das dicas mais importantes em qualquer jornada mundo afora: converse com as pessoas. Afinal, mais do que belos quadros ou tijolos milenares, são elas que pontuam a identidade do lugar.
Lazer
Perambulando pela tarde de Innsbruck, diverti-me com os skatistas que ocupam a Praça Landhausplatz – bem em frente aos prédios governamentais, para desespero dos burocratas – e apreciei as paisagens da orla do Rio Inn, que, acredite se quiser, me lembraram muito o cenário de outro lado do mundo: o canal de Santa Anna Bay, em Curaçao, no Caribe, com suas casinhas coloridas acompanhando a margem.
Enfim, acabei a tarde num dos museus mais inusitados que já tive a oportunidade de visitar: o Grassmayr, dedicado à história dos sinos (ingresso: € 9). Ele fica na fábrica de mesmo nome – a mais antiga empresa familiar de toda a Áustria. Há 14 gerações, desde 1599, os descendentes do fundador Bartlmä Grassmayr produzem os melhores sinos do mundo, usados em mais de cem países, por templos de oito religiões. Só para ter ideia, o sino de 15 toneladas da Igreja Ortodoxa Grega de Jerusalém foi cunhado ali. Assim como o maior sino tubular do planeta, instalado no porto de Aarhus, na Dinamarca.
É bacana acompanhar o processo de fabricação e entender a tecnologia de algo tão tradicional, ou simplesmente descarregar as tensões badalando alguns dos modelos em exposição.
Cassino
Decidi que era hora de descansar um pouco no hotel e partir para o programa noturno: um jantar em alto estilo e uma passadinha no cassino.
E assim o fiz. Primeiro, desvendando a alta cozinha tirolesa no Weisses Rössl, restaurante do hotel de mesmo nome, bem ao lado do Goldenes Dachl. Funcionando no mesmo local desde o ano 1600, ele exibe paredes cobertas de pinturas românticas de artistas locais. Os pratos também são da velha escola, remontando os tempos imperiais. Delícias como a frittatensuppe (caldo de carne com tiras de panqueca) ou a forellenfilet (truta grelhada com rábano), por exemplo. Eu acabei indo numa das receitas mais tradicionais desses rincões alpinos: o kasspatzln, uma espécie de nhoque austríaco, com queijo derretido e uma generosa porção de cebolas fritas por cima. Certamente mais que oportuno para degustar comum bom vinho numa noite fria.
Saciado o paladar, terminei a noite numa daquelas poucas construções de arquitetura futurista de que falei antes: o Cassino Innsbruck, com sua fachada envidraçada, lembrando filmes de ficção científica.
Anexo a um hotel, esse cassino é pequeno e não muito lotado. O lado bom dele é o visual verdadeiramente admirável, inclusive por dentro. O artista plástico austríaco Max Weiler foi o responsável pelas obras que adornam as salas de jogos. Um de seus mais premiados trabalhos, o mural Freudige Komposition, está por ali, no ambiente principal. O lado ruim é o preço das bebidas, dos petiscos e do aluguel de paletó. É isso mesmo: o cassino exige essa peça de vestimenta e, se você não tiver, aluga por € 5 ou não entra.
De qualquer forma, só de poder recuperar no caça-níqueis o valor da taça de Riesling que tomei, já compensou. Então, fui dormir feliz…
Tempo de neve
“Mas cadê a tal estação de esqui?”, você deve estar se perguntando. Pois bem, aproveitei minha última manhã na capital do Tirol para visitar o coração dela: Nordkette. É lá que você tem que ir, em qualquer época do ano, não só no inverno. Porque é dessa montanha que se tem uma das mais extraordinárias vistas panorâmicas de todo o país.
O trajeto é feito em partes e custa € 10,90. Primeiramente, peguei o funicular Hungerburg, ainda na área urbana, a módicos 574 m acima do nível do mar. Em apenas oito minutos, ele me levou à primeira parada, na Praça Hermann Buhl, assim batizada em homenagem a um mundialmente famoso alpinista austríaco.
Em seguida, tomei o teleférico para Seegrube, um mirante a 1.900 m de altitude, com direito a restaurante, bar, loja de suvenires e até mesmo um “parquinho de neve” – isto é, um lugar em que você aluga trenós e brinquedos variados para deslizar montanha abaixo. Ideal para a criançada e para quem não sabe esquiar.
Por fim, tem o Hafelekar, uma gôndola que leva a 2.300 m acima do nível do mar, de onde os esquiadores e snowboarders mais experientes se aventuram encosta abaixo. E onde quem está apenas visitando pode ver de forma privilegiada a cidade de um lado e o Parque Karwendel (maior área de conservação ambiental do Tirol) do outro.
O panorama sublime só me deixou mais entusiasmado para a quarta e última etapa de minha travessia austríaca: a região de Ötztal, badaladíssima por suas estações de esqui, seus spas, parques e cenários usados em produções cinematográficas.
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